Dados da Secretaria de Estado de Fazenda mostram que a soma dos valores de 2021 a 2024 corresponde a quase 40% da dívida com a União
Em um dos estados mais endividados do Brasil, a renúncia fiscal cresceu entre 2021 e 2024 e passou de R$ 13 bilhões para R$ 20,2 bilhões em Minas. Somente nesse período, o aumento da renúncia fiscal, quando o estado abre mão de parte de algum tributo devido por empresas, teve um acréscimo de 55%. São cerca de 7 mil empresas contempladas em 76 regimes especiais, de acordo com informações da Secretaria de Estado de Fazenda (SEF-MG).
Somadas, as renúncias desse período correspondem a quase 40% da dívida de Minas Gerais com a União, estimada em cerca de R$ 170 bilhões, e representam quase o dobro do que o estado precisa arrecadar com a entrega de ativos para abater parte dos juros da dívida com a União no novo modelo de renegociação dos débitos aprovado pelo Congresso Nacional, no fim de 2024.
Os números da Secretaria de Fazenda não refletem todos os dois mandatos do governador Romeu Zema (Novo), que assumiu o comando do estado em 2019. O crescimento pode ser ainda maior, já que o governo só disponibiliza na página da SEF-MG os dados a partir de 2021. Questionada sobre os valores anteriores, a pasta não respondeu até o fechamento desta edição.
Renúncia fiscal concedida por Minas Gerais (SEF-MG)
- 2021: R$ 13 bilhões
- 2022: R$ 15,3 bilhões
- 2023: R$ 18,8 bilhões
- 2024: R$ 20,2 bilhões
O governador vem sendo pressionado pela oposição – e também pelo Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais (TCE-MG) – a adotar mais transparência nessas concessões e a conter os benefícios em função da situação fiscal do estado. Na semana passada, o vice-governador, Mateus Simões (Novo), anunciou que o estado vai divulgar a relação de todos os contribuintes mineiros que fazem jus ao benefício fiscal. Recentemente, o TCE-MG alertou o governo a respeito dos valores elevados de recursos que o estado tem aberto mão em favor das empresas.
Renúncia fiscal estimada na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO/ALMG)
- 2018: R$ 4,8 bilhões
- 2019: R$ 6,1 bilhões
- 2020: R$ 6,8 bilhões
- 2021: R$ 7,9 bilhões
- 2022: R$ 10,1 bilhões
- 2023: R$ 14,8 bilhões
- 2024: R$ 18 bilhões
- 2025: R$ 21,8 bilhões
- 2026: R$ 23,1 bilhões
Ao analisar as contas referentes ao ano de 2022, o TCE-MG observou que os incentivos fiscais concedidos pela gestão Zema naquele ano representaram mais de 10% da receita corrente líquida do estado e se aproximaram dos repasses constitucionais e despesas obrigatórias.
Em 2022, segundo dados da SEF-MG, a renúncia fiscal foi de R$ 10,1 bilhões, frente a uma receita de R$ 89,1 bilhões, sendo que a maior parte desses valores (R$ 81,7 bilhões) vieram de tributos arrecadados pelo estado.
A maior parte das renúncias feitas pelo governo mineiro é por meio da isenção do Imposto sobre Circulação de Mercadoria e Serviço (ICMS). Também constam dos dados informados pela SEF-MG renúncias referentes a Imposto Sobre Propriedade de Veículos Automotivos (IPVA) e Imposto Sobre Transmissão de Causa Mortis e Doação (ITCD), além de taxas não especificadas.
O que é renúncia fiscal?
A renúncia fiscal ocorre quando o governo (federal, estadual ou municipal) abre mão de receber o total ou parte dos tributos devidos. O ato de renunciar a uma receita pública é uma política de governo, com o objetivo, dentre outros, de incentivar o desenvolvimento de setores econômicos estratégicos ou de regiões do país.
Problemas para a economia
A corte de contas também destacou a dificuldade de acompanhar os incentivos que não são votados pela Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) e pontuou ainda que alguns desses benefícios estão sendo concedidos para empresas em vez de setores, o que pode criar problemas para a economia do estado.
Um projeto de lei em tramitação na Assembleia – aprovado em primeiro turno no mês passado – busca dar maior transparência no estado aos regimes especiais de tributação: quando o governo cobra um imposto menor de determinado setor ou atividade empresarial, em relação aos demais contribuintes. De acordo com o vice-governador de Minas, no dia do anúncio da decisão do estado em divulgar os beneficiários dessas renúncias, são cerca de sete mil regimes especiais de tributação no estado.
As renúncias também, conforme apontam os dados da SEF-MG, sempre acabam sendo maiores que o previsto na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) do estado, que fixa as despesas e receitas do ano e também preveem quanto o estado vai abrir mão de impostos. Esses números podem ser consultados na proposta orçamentária enviada pelo estado para ser aprovada anualmente pelo Legislativo.
Em 2021, a LDO previa uma renúncia de R$ 7,9 bilhões, que acabou se consolidando na casa de R$ 13 bilhões. E assim foi sucessivamente nos anos seguintes conforme levantamento feito com base nos dados da lei orçamentária. Na LDO, a previsão de renúncia fiscal no primeiro ano do governo Zema foi de R$ 4,9 bilhões.
Na LDO para 2026, que deve ser votada sempre no ano anterior, a previsão é que o estado abra mão de R$ 23,1 bilhões. A previsão de renúncia no orçamento do ano passado era de R$ 18 bilhões e fechou em R$ 20,2 bilhões. Em 2018, último ano do governo Fernando Pimentel (PT), que antecedeu Zema no comando do estado, a estimativa de renúncia era de R$ 4,8 bilhões.
Polêmica no IPVA
A mais polêmica renúncia fiscal concedida pelo governo Zema e alvo de críticas da oposição é a redução da alíquota de IPVA sobre veículos alugados e revendidos, de 4% para 1%, proposta pelo Executivo e aprovada em 2022, ainda no primeiro mandato do governador.
Na época, o estado alegou que a medida visava evitar a saída das empresas do estado, enquanto a oposição alegava um possível favorecimento à Localiza, empresa de revenda e aluguel de veículos que foi uma das doadoras da campanha de Zema à reeleição.
De acordo com nota enviada à reportagem pelo governo do estado, as renúncias fiscais “são um mecanismo legal utilizado por diversas administrações públicas, visando aprimorar a atração de negócios e estimular a geração de emprego e renda, além de garantir a superioridade competitiva aos estados diante da concorrência de entidades federativas”. O governo destacou ainda que Minas Gerais ultrapassou a marca de 980 mil postos de trabalho, o que coloca o estado no topo do ranking de maior estoque de empregos do país, conforme dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged).
Leia a íntegra da nota da SEF-MG
“As renúncias fiscais são um mecanismo legal utilizado por diversas administrações públicas, visando aprimorar a atração de negócios e estimular a geração de emprego e renda, além de garantir a superioridade competitiva aos Estados diante da concorrência de entidades federativas. Em Minas, atualmente existem cerca de 7 mil empresas contempladas em 76 regimes especiais. Minas Gerais ultrapassou a marca histórica de 980 mil postos de trabalho gerados pela atual gestão, o que coloca o Estado no topo do ranking de maior estoque de empregos do país, conforme dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged).
Este é um dos resultados consolidados pela estratégia de renúncias fiscais, responsável também por desenvolver o Produto Interno Bruto (PIB) de Minas Gerais, que pela primeira vez na história alcançou a inédita marca de R$ 1 trilhão, em 2024.
Com respeito aos valores renunciados nos anos de 2018, 2019 e 2020, constam das prestações de contas enviadas ao TCE/MG nas respectivas datas. O Governo de Minas, motivado pela transparência na administração pública, está em tratativas para publicar a relação de empresas beneficiadas.”
Com informações do Portal Estado de Minas