Ação descentralizada de gangues vira desafio no combate à criminalidade nas maiores cidades do Vale do Rio Doce, que têm nos homicídios fonte de preocupação
As disputas de gangues de traficantes por territórios e fatias do mercado de entorpecentes são a explicação de forças policiais e especialistas em segurança pública para a violência nas grandes cidades do Vale do Rio Doce, sobretudo em Governador Valadares. Contudo, não há uma importante relação com as principais organizações criminosas de alcance nacional que agem nos estados brasileiros. É o que mostra levantamento do Estado de Minas que mapeou os crimes violentos nos maiores municípios mineiros em 2024, considerando dados populacionais do IBGE.
Os registros de homicídios se destacaram mais nos municípios de maior população no Vale do Rio Doce do que na média dos crimes violentos das 72 cidades com mais de 50 mil habitantes de Minas Gerais. Os cinco municípios mais populosos da região têm nos assassinatos um índice de 15,9% no total de crimes violentos, enquanto a média dos grandes centros mineiros foi de 6,8%.
A situação mais crítica é observada em Governador Valadares, maior cidade da região, com 257.171 moradores, e que registrou 36,1 vítimas de homicídio por 100 mil habitantes e 202,9 crimes violentos em geral por 100 mil. Isso coloca o município como a segunda pior localidade em taxa de assassinatos no estado, atrás de Esmeraldas, na Grande BH, e a nona em criminalidade violenta em geral. Os outros municípios da região avaliados no levantamento do EM são Caratinga, Coronel Fabriciano, Ipatinga e Timóteo.
Especialista em inteligência de Estado e segurança pública, o coronel Carlos Júnior procurou agentes das forças policiais da ativa e inativos para entender o contexto da violência na região. “Não se nota no Vale do Rio Doce e principalmente em Governador Valadares uma atuação que seja marcante das maiores facções criminosas do país. Os indicativos dos crimes são de pequenos grupos, em sua maioria chefiados por pessoas muito jovens, sem muito escrúpulo, que não pensam no amanhã. São descritos como ‘imediatistas’. Se tiverem de executar um rival, eles executam. Não tem questão de moral, poucos têm algum princípio. Existe muito esse conflito entre gangues e mortes por dívidas ou para demonstrar poder”, afirma.
Contudo, chamou a atenção do especialista o fato de a sensação de insegurança em Governador Valadares ser atribuída com mais intensidade a crimes contra o patrimônio do que propriamente aos homicídios. “Pelos relatos que recebi, o homicídio para o cidadão de bem não é tido como um grande problema. Na cabeça de grande parte das pessoas, quem morre tem conflito com gangues ou é envolvido com drogas. Quando um empresário ou um trabalhador é assassinado aí, sim, se gera um pânico, uma revolta”, descreve o coronel Carlos Júnior.
Considerando a criminalidade conjunta dos cinco municípios da região, a taxa de crimes violentos do grupo alcança 153,9 por 100 mil habitantes e a de homicídios é de 25,5 por 100 mil habitantes. Os crimes violentos estão abaixo do nível estadual (157,3), mas as vítimas de homicídio são quase o dobro do índice mineiro (13,4).
Por que mais se mata na região
As atividades de quadrilhas e o comércio de entorpecentes se destacam entre as motivações para homicídios na região. Das causas levantadas preliminarmente para os assassinatos, a de maior volume é o envolvimento com drogas e tráfico (35,8%), a ação de gangues e facções criminosas (26,9%), as brigas e atritos (26,9%), as vinganças (17,9%) e razões passionais (9%). As vítimas não tinham relacionamento com seus assassinos em 50,9% das causas conhecidas, mas eram amigos ou conhecidos em 28,1%, vizinhos em 8,8% e cônjuges ou companheiros em 5,3%.
Os bairros com mais vítimas de homicídios nos cinco municípios do Vale do Rio Doce são o Turmalina (5,5%), em Governador Valadares, Cachoeira do Vale (Timóteo), com 3,4%, Canaã (Ipatinga), com 2,8%, Esperança (Caratinga), com 1,4%, e o bairro de mesmo nome e índice em Ipatinga. Os locais onde os crimes mais ocorreram foram as vias de acesso público (65,6%), casas (19,6%), bares, lanchonetes e restaurantes (3,2%).
Outras formas de violência
Pelos critérios da Sejusp, os crimes violentos abrangem extorsão mediante sequestro e as modalidades tentada e consumada de estupro, estupro de vulnerável, extorsão, homicídio (considerando apenas as ocorrências e não o número de mortos), roubo, sequestro e cárcere privado. Nesse universo, os roubos representam 64,1% da criminalidade violenta total nos 72 municípios mineiros com população superior a 50 mil habitantes, sendo a principal infração que influencia o índice de violência.
No Vale do Rio Doce, o roubo também se destaca como a principal modalidade violenta nos cinco maiores municípios, com 47% das ocorrências totais, seguido das tentativas de assassinato (17,5%), estupro de vulnerável (13,1%), homicídio (9,2%) e o estupro (5,2%).
Crimes que foram cometidos com uso de armas de fogo (40,1%), ameaças (24,4%), armas brancas (17,3%) e agressões físicas sem emprego de instrumentos (5,1%). Os cenários mais constantes para essas ocorrências são as vias de acesso público (65,6%), casas (19%), bares, lanchonetes e restaurantes (3,5%). Os bairros concentradores de ocorrências são o Planalto (2%), em Governador Valadares, e Bela Vista (1%), em Coronel Fabriciano.
Com informações do Portal Estado de Minas